Pode um viciado em drogas duras levar um hino de liberdade ao número um das tabelas de vendas americanas, poucos dias após a sua própria morte por overdose? No Modo Classic Rock desta semana Me and Bobby McGee, de Janis Joplin, prova que sim. E ainda conta mais algumas histórias…
Texto de Maria Coutinho
Escrito em 1968 por Kris Kristofferson (autor/compositor/musico) e Fred Foster (autor/compositor/produtor/editor), o tema Me and Bobby McGee foi lançado no ano seguinte por Roger Miller que, como bom músico de Nashville, apresentou o tema com uma sonoridade Folk.
Kris e Janis Joplin eram bons amigos, e chegaram a manter uma relação mais íntima. Foi ele o primeiro a mostrar à cantora a música que havia composto, mas ela não lhe terá dito que iria gravá-la; seria uma surpresa. É irónico que a surpresa tenha sido maior do que Janis planeara: o amigo só saberia desta gravação, feita alguns dias antes, no dia seguinte à morte da voz de “peace of my heart” por overdose de heroína. Kristofferson chegou a afirmar que durante muito tempo era para si um choque ouvir a sua composição na voz da amiga que já tinha partido.
A morte de Joplin excitou a curiosidade e devoção dos fãs, e o álbum “Pearl” tornou-se num fenómeno de vendas. O single Me And Bobby McGee foi o segundo a chegar ao número um do top de vendas dos E.U.A. postumamente, depois de (Sittin’ on ) The Dock of the Bay, de Ottis Redding.
Este tema, que Janis fez saltar para os tops, contribuiu em muito para a popularidade de Kristofferson como autor/compositor, e conheceu muitas versões, pela voz de outras estrelas de vários quadrantes do mundo artístico. Podemos citar alguns nomes, a título de exemplo, pois a lista completa é mesmo muito longa: Kenny Rogers, Gratefull Dead, Jerry Lee Lewis, Olívia Newton-John, Chet Atkins, Gianna Nannini, o grande Johnny Cash e, mais recentemente, Jennifer Love Hewit (estrela da série de TV Entre Vidas), Dolly Parton e Pink.
A letra da música é um hino a uma liberdade que a própria Janis nunca conseguiu alcançar. Na verdade, ela nunca conseguiu ser completamente livre, pois foi sempre condicionada, ao ser a vítima em muitas situações da sua vida: do bullying, às mãos dos colegas de escola e universidade, dos amores frustrados por amantes que não a completavam nem a faziam feliz, das críticas da moralidade social dominante, das drogas idílicas dos sonhos da sua geração… Em última análise, terá sido vítima de si própria, dos valores quiméricos do “flower power” e do estilo de vida de “rock star”…
Talvez fosse isso que levou Kris a afirmar certa vez que “a música não foi escrita para Janis Joplin, mas tem a ver com ela”.
Ao ouvir o “Som À Letra” deste tema pela primeira vez com atenção, saltei de imediato para o best seller da geração Beatnik, na qual Janis bebeu tantos dos valores que a definiam. “On The Road” (“Pela Estrada Fora”) de Jack Kerouac é um romance que conta a história de dois amigos na estrada, procurando conhecer os E.U.A. e as suas muitas sub-culturas, à boleia, sem rumo, cantando, tocando, amando, numa liberdade que, de tão absoluta, exige que os amigos se separem….
Afinal, a amizade é um doce grilhão, um tesouro de apoio mútuo e segurança, do qual poucos poderiam abdicar… Mas a Liberdade é, na frase mais conhecida deste tema, apenas mais uma palavra para definir o estado de quem não tem nada a perder – nem mesmo o seu melhor amigo, o seu Bobby McGee.
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